Alguém que está de fora daquilo que se passa nas escolas e do que se passa no país, pergunta-me: afinal qual é o problema entre a classe dos professores e a ministra?
A resposta a esta questão não é simples, mas assenta desde logo numa atitude de constante afronta e desrespeito de Maria de Lurdes Rodrigues para com os professores. De cada vez que fala, a senhora ofende a classe. A estratégia política deste governo para conseguir "reformar a educação" passa por uma propaganda política constante, pela camuflagem dos actos, pelo desdizer do que foi dito, e, acima de tudo, um fazer passar da imagem de que tudo o que de mal se passa na educação em Portugal é culpa dos professores. O governo quis e quer passar a imagem de que os professores são uma cambada de malandros, uma classe privilegiada, que ganha muito e trabalha pouco. Nada poderia ser menos verdadeiro, mas não é para mostrar provas disso que aqui escrevo. As provas do trabalho dos professores estão em cada escola deste país e em cada cidadão formado ao longo dos anos. Melhores ou menos bons profissionais, cidadãos mais ou menos exemplares existem e sempre existirão. Afinal de contas somos todos diferentes.
Acontece que basta ter inteligência, que é coisa que não falta aos professores - e saber ler - coisa que os professores também sabem fazer, para perceber que aquilo que governa este ministério da educação é o trabalho para a estatística e para a economia, do verbo economizar. Tudo isto à custa de coisas bem caras, e que deviam ser essenciais para quem se preocupa com a educação. Em vez de querer qualificar realmente as pessoas, oferecem-se diplomas. Em vez de querer apostar no rigor, oferecem-se exames fáceis. Em vez de assumir que há alunos que têm mais dificuldades, põem-se os professores a preencher mais papéis. Afinal de contas não se olha a meios para ter, não tarda muito, uma população portuguesa cheia de qualificações que existem só no papel.
O novo Estatuto da Carreira Docente dividiu de forma aleatória os professores em duas categorias: os titulares e os meros professores. Tão bem feita foi a divisão (já designada por alguns como o "sorteio" para titular) que se podem encontrar na categoria supostamente superior, pessoas com menos qualificações académicas ou com menos anos de serviço. Depois criam-se quotas para acesso a titular, pois há que poupar dinheiro. Eu dificilmente lá chegarei, mas não me preocuparei para já com isso. Vejamos: é desta espécie superior dos titulares que saem os famigerados avaliadores, com todos os desconfortos que daí advêm. A seguir cria-se a figura do director todo-poderoso. Já não há eleições para eleger um conselho executivo na escola. Qualquer um pode candidatar-se a director de qualquer escola, não é preciso conhecer a realidade do meio. Caminha-se para a escola-empresa. O director nomeia a torto e a direito, a democracia começa a extinguir-se na escola e cria-se o compadrio.
A nova avaliação (sim, porque a avaliação sempre existiu) é um processo mal concebido, um monstro burocrático, que consome tempo e paciência a toda a gente, e que em nada contribui para a melhoria das práticas docentes. Foi um modelito importado do Chile, país onde foi implementado e já está a fracassar. Aliás, também cá o processo fracassa à nascença, pois já necessitou de ser "simplificado" duas vezes. Resta saber quantas mais vezes será "simplificado", até alguém admitir que está tudo desvirtuado, e que afinal o processo não era nada eficaz.
No meio de tudo isto, os professores saem à rua, numa esmagadora maioria, por duas vezes, e mostram o seu descontentamento. Mas não, isso não quer dizer nada! São uma cambada de laxistas, comodistas, chantagistas! Finalmente foram obrigados a trabalhar, e naturalmente, não querem!
É insultuoso e vergonhoso.
Os alunos, descontentes com o novo estatuto, segundo o qual um aluno doente é tratado exactamente da mesma forma que um aluno baldas, protestam e atiram ovos à ministra. Muda-se o estatuto do aluno. Uma lei é alterada por despacho ministerial: estamos na república das bananas. Ah, esperem! Foi só um esclarecimento, os professores é que tinham percebido tudo mal e aplicaram o estatuto erradamente! É óbvio que este Ministério nunca erra, nunca se engana, nunca tem dúvidas. O sonho de Maria de Lurdes Rodrigues é ser ditadora. Aliás, peço desculpa, não é um sonho, é uma realidade.